Elegância não é de comportamento

Há alguns anos escrevi um texto ao qual dei o belo título “A elegância e o peido”, onde demonstro explicitamente o que penso sobre a noção de “elegância”. Hoje me deu vontade de escrever de novo sobre esse tema porque recebi novamente um texto que já conhecia. É o texto a seguir, atribuído a Toulouse Lautrec (não sei se este é realmente o verdadeiro autor).

“A elegância do comportamento

Existe uma coisa difícil de ser ensinada e que, talvez por isso, esteja cada vez mais rara: a elegância do comportamento.
É um dom que vai muito além do uso correto dos talheres e que abrange bem mais do que dizer um simples obrigado diante de uma gentileza.
É a elegância que nos acompanha da primeira hora da manhã até a hora de dormir e que se manifesta nas situações mais prosaicas, quando não há festa alguma nem fotógrafos por perto.
É uma elegância desobrigada.
É possível detectá-la nas pessoas que elogiam mais do que criticam.
Nas pessoas que escutam mais do que falam. E quando falam, passam longe da fofoca, das pequenas maldades ampliadas no boca a boca.
É possível detectá-la nas pessoas que não usam um tom superior de voz ao se dirigir a frentistas.
Nas pessoas que evitam assuntos constrangedores porque não sentem prazer em humilhar os outros.
É possível detectá-la em pessoas pontuais.
Elegante é quem demonstra interesse por assuntos que desconhece, é quem presenteia fora das datas festivas, é quem cumpre o que promete e, ao receber uma ligação, não recomenda à secretária que pergunte antes quem está falando e só depois manda dizer se está ou não está.
Oferecer flores é sempre elegante.
É elegante não ficar espaçoso demais.
É elegante, você fazer algo por alguém , e este alguém jamais saber o que você teve que se arrebentar para o fazer…
É elegante não mudar seu estilo apenas para se adaptar ao outro.
É muito elegante não falar de dinheiro em bate-papos informais.
É elegante retribuir carinho e solidariedade.
É elegante o silêncio, diante de uma rejeição…
Sobrenome, jóias e nariz empinado não substituem a elegância do Gesto.
Não há livro que ensine alguém a ter uma visão generosa do mundo, a estar nele de uma forma não arrogante.
É elegante a gentileza,.atitudes gentis falam mais que mil imagens…
…Abrir a porta para alguém…é muito elegante (Será q ainda existem homens assim?)…
…Dar o lugar para alguém sentar…é muito elegante…
…Sorrir, sempre é muito elegante e faz um bem danado para a alma…
…Oferecer ajuda…é muito elegante…
…Olhar nos olhos, ao conversar é essencialmente elegante…
Pode-se tentar capturar esta delicadeza natural pela observação, mas tentar imitá-la é improdutivo.
A saída é desenvolver em si mesmo a arte de conviver, que independe de status social: é só pedir licencinha para o nosso lado brucutu, que acha que “com amigo não tem que ter estas frescuras”.
Se os amigos não merecem uma certa cordialidade, os desafetos é que não irão desfrutá-la.
Educação enferruja por falta de uso.
E, detalhe: não é frescura.”

Muito bonito texto. Muito bons conselhos. Essa atitude em relação ao mundo se faz cada vez mais necessária. Não escrevo entretanto novamente sobre o assunto para corroborar a noção de elegância. Mantenho minha opinião sobre ela. Elegância é uma tola fantasia criada pela nossa vaidade para que algumas pessoas se achem melhores que outras.
O que está incorreto nesse texto é a associação entre a idéia de bom comportamento com o que se convencionou chamar de elegância que, a meu ver está muito mais associado à idéia de “bem vestir”, ou talvez pudéssemos dizer se vestir da forma que quem fabrica roupas ou pertence a essa área profissional, acha que devemos nos vestir. Entendo que muitos associam essa palavra ao comportamento, mas mesmo se considerarmos que elegância esteja associada a comportamento, não vejo uma “pessoa elegante” fazendo um trabalho pesado. De novo a vaidade e o querer ser melhor que que o outro. Pra mim elegância não tem nada a ver com comportamento. Tem a ver somente com aparências.
O texto cita algumas qualidades de extrema importância, mas distintas entre si e especialmente distintas da noção de elegância. As coloca sob esta definição como se ela as abrangesse. Não é o caso. Vejamos o que o texto aconselha e o que penso que seja:

Dizer um simples obrigado diante de uma gentileza. – Ter reconhecimento
Manter seu proceder quando não há festa alguma nem fotógrafos por perto. – Coerência, ser verdadeiro
Elogiar mais do que criticar. – Incentivar
Escutar mais do que falar. – Conter a impulsividade, ter humildade, paciência, reconhecer a ignorância, conter a vaidade, ter vontade de aprender
Passar longe da fofoca – Não ser maldoso
Não usar tom superior de voz ao se dirigir a frentistas. – Conter a vaidade, não se achar melhor que ninguém
Evitar assuntos constrangedores para não humilhar os outros. – Ter consideração
Ser pontual. – Ser disciplinado e organizado
Demonstrar interesse por assuntos que desconhecemos. – Ter humildade, reconhecer a ignorância, conter a vaidade, ter vontade de aprender
Presentear fora das datas festivas. – Ser amigo
Cumprir o que promete. – Ter credibilidade
Não recomendar à secretária que pergunte antes quem está falando e só depois manda dizer se está ou não está. – Humildade, conter a vaidade, não se achar melhor que ninguém, não abusar de seu poder
Oferecer flores . – Elogiar a beleza de uma mulher. Comparando-a à beleza daquelas flores
Não ficar espaçoso demais. – Não se achar melhor que ninguém, saber seu lugar, conter sua vaidade
Fazer algo por alguém sem que este alguém jamais tenha que saber o que vc teve que fazer para conseguir. – Não pensar em reconhecimento
Não mudar seu estilo apenas para se adaptar ao outro. – Acreditar em si mesmo
Não falar de dinheiro em bate-papos informais. – Não se achar melhor que ninguém, ser seguro, conter sua vaidade.
Retribuir carinho e solidariedade. – Ter reconhecimento pelos outros
Silenciar, diante de uma rejeição. – Não ser chato, conter a vaidade, saber seu lugar.
Não ligar para sobrenome e jóias. – Não ser fútil, conter a vaidade, não se achar melhor que ninguém
Não empinar o nariz. – Não ser fútil, conter a vaidade, não se achar melhor que ninguém.
Ter gestos humildes. – Ter humildade.
Ter uma visão generosa do mundo. – Não ser mesquinho
Ser gentil. – Idem
Abrir a porta para alguém. – Ter zelo por seu próximo
Dar o lugar para alguém sentar. – Ter zelo por seu próximo
Sorrir. – Ser alegre
Oferecer ajuda. – Ter zelo por seu próximo
Olhar nos olhos ao conversar. – Ser sincero, não se esconder.
Desenvolver em si mesmo a arte de conviver. – Ser maduro.
Manter essas posturas mesmo com amigos íntimos. – Ser verdadeiro.
Ser educado. – Idem
Não tomar esse comportamento por frescura. – Ter paciência e zelo

Então compilando as qualidades que o texto relata:

Conhecimento, reconhecimento, coerência, incentivo, humildade, paciência, vontade de aprender, consideração, disciplina, organização, amizade, credibilidade, saber seu lugar, acreditar em si mesmo, segurança, generosidade, gentileza, zelo, alegria, maturidade, sinceridade, educação e bondade. E temos também o texto recomendando conter a impulsividade, reconhecer a ignorância, não ser maldoso, não se achar melhor que ninguém, não abusar de seu poder, não pensar em reconhecimento, não ser chato, não ser fútil.

Eu realmente não consigo associar todas essas qualidades à palavra “elegância”. Consigo associar às palavras bondade, serenidade, respeito, equilíbrio. Mas me parece que elegância sempre esteve ligada ao vestir e à aparência, ligada portanto à vaidade e não ao caráter de quem veste. Quem olha para a aparência, ainda não aprendeu a olhar para o coração. Quantas e quantas pessoas ditas elegantes foram tão corruptas, quantos mataram tantos. Como era elegante a cúpula nazista, como são elegantes tantos políticos corruptos, como é elegante uma mulher que gasta em um pedaço de pano valores que dariam para construir algumas casas para quem delas necessita.
Elegância me parece estar ligada ao executivo vestido no seu “elegante” terno ou ao vestido de noite de quem pretensamente pertence a uma “classe superior” (cada um desses termos parece mais ridículo que o outro). Ao se vestir segundo ditam as regras da “elegância“ estas pessoas dizem tão somente: “Tenho que me vestir assim para demonstrar que quero ser melhor que você. Essa roupa me faz mais limpo, mais organizado, mais produtivo do que você” mas não faz não. Se ela não for um meio de compensar suas inseguranças, só faz você mais arrogante e se for fica mais inseguro ainda.
Por mais que tente não consigo separar a palavra “elegância” de vaidade, futilidade, inutilidade.
No final essa forma de vestir não faz nada além de deixar alguém mais parecido com uma máquina, mais e mais controlado pelo pensamento alheio do que pelo seu próprio.
Todo o resto é somente mais uma das fantasias da nossa pequena matrix azul em forma de esfera.
Bondade sim, educação sim, respeito sim, amizade sim, bom comportamento sim, mas elegância mesmo, eu tô dispensando.

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