Balizar-se

A vida pode ser vivida deixando que os acontecimentos nos conduzam. Podemos ser apenas passageiros no barco da vida, nos sentindo bem quando acontecem benesses e mal quando o sofrimento se apresenta.
Para quem assim vive, pouco importa o juízo de valor do comportamento pois apenas sente o passar do tempo sem ser um agente ativo em seu destino.
Mas um bom número de pessoas se preocupa sim em procurar acertar em suas decisões. Em achar um “norte” uma “direção”. Algo que sirva como balizador, que possa servir de guia para as decisões que surgem na vida de cada um.
Este balizador é dado por uma multiplicidade de meios: pais, escola, amigos, conhecimento científico, religião e a própria experiência de vida são alguns deles. Normalmente se apresentam em forma de ensinamentos que aprendemos e refinamos ao longo da vida.
Algumas pessoas procuram criar sistemas, métodos de aprendizagem, grupamentos de ensinamentos que procuram auxiliar a viver. Cada um deles adequado a algumas compreensões e inadequado para outras.
Vejo entretanto que estes ensinamentos têm uma polarização binária: alguns têm como base uma atitude mais voltada ao individualismo e outros ao coletivismo.
Vejo na raiz deles 2 visões arquetípicas:
-a visão individualista competitiva de que cada ser humano deve buscar o melhor para si mesmo, tendo como meta seu desenvolvimento pessoal e portanto esse objetivo faz com que (para ele) sua individualidade tenha importância superior ao outro. Nesta visão o “si mesmo” é muitas vezes disfarçado como “minha família”, “meus amigos”, “meu meio”, de forma a justificar pra si mesmo a correção do seu pensamento. Reparemos que neste caso justifica-se dizendo que não é “para si” e sim “altruisticamente” para a família, amigos, etc.
-a visão coletivista cooperativista que já compreende que o nosso bem depende do bem comum porque cada ser humano está intrinsecamente ligado a todos os outros seres humanos na Terra. O sofrimento de um ser humano que às vezes parece estar tão longe de nós, é sujeito a nos atingir rapidamente.
Vejo que dessas duas visões, apenas uma é verdadeira. A outra é uma ilusão, que leva no final das contas à outra porque a pessoa, ao buscar o caminho da visão individualista/competitiva, percebe que o sofrimento que ali existe e que às vezes precisa gerar, retorna pra ela em forma de portas fechadas, oportunidades perdidas e (falando genericamente) mais sofrimento.
Já na outra visão procuramos nos melhorar, pensar menos em nós e pensar mais enquanto coletividade humana. Procuramos auxiliar à melhora da humanidade como um todo.
Então se somos uma dessas pessoas que busca um norte, que busca encontrar quais os melhores conceitos para nos guiar vejo que precisamos tomar uma decisão antes de qualquer outra: escolher qual das visões queremos que norteie nossa vida.
Qualquer decisão que tomemos a este respeito é boa, porque um caminho leva à evolução à busca por um aprimoramento constante e o outro leva ao aprendizado de que este primeiro objetivo é que é o único caminho possível.
Quando escolhemos a visão coletivista, a visão de entender que o coletivo é superior ao individual, ampliamos nossa perspectiva da realidade e as pequenas contrariedades do dia a dia ganham uma dimensão muito menor e mesmo nossa própria individualidade diminui.
Então compreendemos que há necessidade de trabalhar para que estes sentimentos possam se multiplicar e ir melhorando a humanidade ao longo do tempo.
Procuramos então o caminho da ética, de afastar os sentimentos duros, pesados e procuramos cultivar os bons sentimentos e o desapego da negatividade.
Aprendemos a dosar firmeza de propósito, complacência, justiça e bondade. Apendemos a abandonar o que piora os nossos sentimentos e fortalecer o que os melhora.
Aceitamos então isso como nosso dever e assim passamos conduzir nossa vida. Esta ética passa a ser o nosso balizador e não mais o querer pra si (leia-se para nossa família/amigos/meio/país), porque compreendemos que nossa família é a humanidade e só há possibilidade de recebermos boas coisas quando toda a humanidade também receber. Porque senão para que sejamos felizes temos que o olhar para o lado e não ver o sofrimento alheio, o que já carrega um egoísmo em si. Há que trabalhar por uma ética para a humanidade, ao invés da busca do melhor pra si. Procurar a coragem de fazer o que é necessário, procurar desenvolver em nós a paciência com nosso próximo, a bondade inquebrantável mesmo perante a injustiça, a retidão de caráter, a sobriedade, a fidelidade e lealdade sem comprometer a ética. Procurar o equilíbrio no pensamento e nas decisões. Focar no trabalho árduo para nos melhorarmos e melhorarmos a humanidade como um todo.
Todos nós estamos neste caminho. Com uma ou outra visão, só há um caminho. Porque um caminho leva ao outro.
Sendo assim nossos irmãos que estão procurando acertar mas cometem erros (às vezes graves) precisam ser tratados com o balizador que escolhemos inicialmente: se a pessoa escolhe o balizador da individualidade, estes irmãos passam a ser um problema no caminho de realizar suas aspirações e só o que importa é tirá-los do nosso caminho. Ao tratá-los desta forma recebemos mais sofrimento e nossas aspirações ficam ainda mais distantes.
Já se escolhemos o balizador da coletividade compreendemos que quando encontramos um irmão no erro o que ele precisa é de auxílio para encontrar o caminho para fora daquela situação e assim trazer paz pra ele e pra nós. O melhor neste caso é entender que nós temos uma ligação com aquele ser por mais distante que ele nos pareça agora.
E é por isso também que precisamos compreender que para alguns casos há necessidade daquele irmão passar por um sofrimento para que possa enxergar melhor como evoluir.
E é por isso que precisamos do balizador da ética para podemos entender que este processo precisa iniciar em algum momento e quanto antes aquele irmão chegar na correção do seu comportamento melhor.
E é por todos esses motivos que em certos casos mais graves precisa também de haver a coragem para intervir uma vez que todos nós fazemos parte da coletividade. Intervir dentro da correção, da retidão, da ética e da bondade mas também não ser complacente com delitos graves, porque não devemos permitir que o erro seja perpetuado. Erros são para serem corrigidos.
Mas há que ter o bom senso de distinguir quando uma situação é grave o suficiente para isto e quando um irmão errou mas está se esforçando por melhorar.
Então concluindo, o que precisamos entender é que o balizamento pela coletividade é o único caminho possível e neste caminho precisamos pautar pela ética, correção, equilíbrio, fidelidade mas também precisamos auxiliar nossos irmãos a chegarem a um momento melhor em suas vidas, tendo coragem pra fazer o que é necessário e não sendo coniventes com comportamento que geram sofrimento e levam a mais sofrimento para ele e para os outros.
Precisamos de paz e paz só se constrói em união. Todos juntos dando as mãos nos auxiliando mutuamente a subir pra uma compreensão mais elevada e um mundo mais justo.

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