Distopia ou Utopia ?

O mundo nunca foi um lugar fácil. Injustiças sempre existiram. Mas acho que o que todos queremos é viver em um mundo melhor, seja lá qual esse mundo for. Acredito que todas as pessoas quando argumentam, quando opinam sempre querem o bem.

O bem é uma unanimidade. Mesmo quem diz “querer o mal” a alguém o faz pensando em um senso de justiça, que é algo bom. Quando alguém faz faz mal a outra pessoa ou a muitas outras pessoas ela ainda quer “o bem’. Apenas quer “o bem” para si mesmo. Mas ainda é “o bem”. E mesmo quando ela segue no caminho do “bem pra si” ela pensa que só está fazendo isso porque o mundo “assim obriga”.

Então todos querem o bem. Todos querem o bem quando defendem conceitos como a meritocracia, penas mais duras, pena de morte, ordem, governo forte, desenvolvimento econômico, mais empregos.

Cada um ter que fazer por onde merecer é um conceito que parece a muitos, lógico, correto, digno. O sofrimento de quem fez sofrer parece nada mais do que a justiça. A eliminação de um indivíduo que parece a muitos nocivo parece nada mais que um alívio. Governo forte que ponha ordem na casa parece um pilar da paz. Desenvolvimento econômico lembra progresso, vida melhor. Mais empregos lembra mais desenvolvimento mais progresso.

Mas esses pensamentos e opiniões caem facilmente por terra se confrontados com algumas realidades simples, porém esquecidas.

É conveniente falar em meritocracia quando se teve uma vida difícil, mas pelo menos possível. Quando a gente conquista coisas com dificuldade mas vai conseguindo progredindo na vida. Não falo nem de quem nasceu com todas as condições porque aí é hipocrisia. Mas compreendo que quem teve uma vida difícil e conseguiu progredir ache que a meritocracia é a melhor opção. Quem vai por este pensamento esquece dos milhões que passaram fome na infância e têm dificuldades de aprendizagem, esquecem de quem teve doenças na infância por desnutrição, esquece dos muitos meios sociais intelectualmente deficientes nos quais estudar é até ridicularizado. Quantos milhões de seres humanos foram criados assim ? como fazê-los progredir se nem querer eles querem ? Se sua cultura e valores estão voltados para uma cultura que os aprisiona ? O progresso, o estudo, uma vida melhor para quem nasceu ali não é difícil. É impossível. Porque estão de tal forma condicionados ao imediatismo que a própria perspectiva de evolução não se apresenta.

O que fazer com eles ? Eles merecem morrer por não terem a capacidade para se encaixar no “esquema das coisas” ? Merecem morrer por não terem perspectivas ? O que fazemos com o “seu fulano” que mal sabe fazer as quatro operações ? Vamos matá-lo também ? mesmo ele sendo uma boa pessoa que nunca fez mal a ninguém e sempre tratou todo mundo bem ?

Alguns deles são tão ruins em fazer escolhas certas na vida que só vêm a criminalidade como opção. Sua mente simplesmente não vê outra saída. O que fazer então ? Será que a pena de morte é o adequado a todos eles ? devemos realmente trazer de volta as “câmaras de gás” nazistas para dar conta de todos eles ?

Será que não é a nossa mente que está também limitando suas opções ?

Se concordamos que pessoas sem capacidade e que tendem a fazer péssimas escolhas não merecem morrer, começarmos a enxergar que a atual estrutura social que vivemos não tem como resolver os problemas sociais. Ela é que é a fonte dos problemas porque se baseia na premissa de “cada um por si”.

Alguns simplesmente não têm a capacidade de sobreviver dignamente por si próprios. E agora ?

Não me diga que projetos assistencialistas do governo vão resolver isso porque não vão. Estes projetos são sempre de alcance limitado e são somente paliativos e muitas vezes estão lá apenas para que o governo possa fazer propaganda em tempo de eleição.

Você pode também observar o que está surgindo ao nosso redor. Com certeza tem ouvido cada vez mais se falar de drones. Drones entregando coisas, drones garçons, drones militares. Você vê a automatização ganhando força substituindo profissões em todos os lugares, desde as mais complexas indústrias até lanchonetes. Você está vendo a indústria automobilística competindo a toda velocidade para colocar carros autômatos no mercado. Você vê impressoras 3D cada vez mais baratas e produzindo coisas cada vez mais complexas. Você vê robôs substituindo soldados em todo canto.

Pergunto: o que será de nossa estrutura social “capitalista”, do nosso modelo dito “econômico” quando o desemprego atingir 90% ou mais ? Quando não houverem mais empregos porque todos os empregos forem substituídos por robôs ? Quando todos os caminhões, trens, aviões, carros e motos que hj são conduzidos por pessoas forem autômatos ? Quando a TV tiver acabado porque ninguém mais assiste a uma mídia onde não podemos escolher nem quando nem o que assistir ? O que farão os jornalistas quando não existirem mais jornais porque blogs são muito mais interessantes e direcionados ? Quando o diagnóstico médico for muito mais correto usando redes neurais e quando os cirurgiões forem substituídos por robôs mais precisos ?

Ainda teremos condições de manter a fantasia da ‘meritocracia” ?

Você acha realmente viável com a população aumentando do jeito que está fazer uma sociedade intelectualmente deficiente alcançar o nível de trabalhar em profissões intelectualmente avançadas ?

Só há um caminho possível: cada ser humano tem que ter todas as condições para viver, apenas porque nasceu. O “merecimento” dele é ter nascido. Todas as condições implica: casa, comida, roupa, materiais de estudo, móveis, transporte, assistência médica e materiais de estudo livres. Tudo tem que ser livre pra todos.

Ria. Parece utópico né ? Mas você prefere utopia ou distopia ?

Ao contrário de utópico esta ideia é que é a realidade de facto. Dinheiro, modelo econômico, estado, lei, emprego, meritocracia, capitalismo, bancos, empresas… tudo isso são apenas construções sociais.

Necessidade de ter uma casa, necessidade de comer, necessidade se vestir (frio), necessidade de estudar como as coisas funcionam, necessidade de utensílios para manipular coisas, necessidade de transporte, necessidade de assistência médica são coisas criadas pela natureza, uma força muito maior que qualquer construção humana.

Pense da seguinte forma: o que está acima ? nossas construções sociais ou as forças naturais que regem o homem ? o que é mais importante ? a sobrevivência do homem ou a sobrevivência de uma estrutura social criada por ele ?

Não tem jeito: é o homem que tem que se adequar à natureza e não o contrário como nossa arrogância às vezes faz parecer.

Então você pode pegar essa ideia e usar palavras marcadas como “assistencialismo”, “comunismo” ou outras. Eu vejo como única opção possível garantir a sobrevivência e vida digna de todos.

Só nos livramos de um futuro distópico se acreditarmos que a utopia é possível e começarmos a caminhar pra lá.

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