A terceira vertente

Muitas vezes define-se individualismo como a ênfase individual de si sobre os outros e coletivismo como a oposição a esse conceito. Associações de pessoas que se fortalecem por estarem juntas. Entretanto estas normalmente se opõem a outro grupo humano. E aqui está onde vejo essas duas atitudes se igualarem. Ao invés de ser indivíduo contra indivíduo, passamos a ter grupo contra grupo, o que no final dá no mesmo, ou seja, a idéia de conflito permanece. O coletivismo da forma que ele é normalmente conhecido, é o individualismo aplicado a um grupo.

Sabemos obviamente que as coisas não são tão simples assim e que muitas outras nuances permeiam estes dois conceitos.

Nunca gosto de usar os termos bem e mal, luz e trevas porque eles além de extremamente batidos, apresentam uma conotação social por demais conflitante e geradora de reações fortes demais para que se mantenha qualquer discussão plausível.

De qualquer forma acredito que existam duas forças opostas na natureza. Chamem como quiserem. Eu dou os nomes de coletivismo e individualismo a estas forças. Entretanto não utilizo estes termos no conceito geral acima citado e muito menos com a conotação tradicional de bem e mal.

Acredito no individualismo como uma atitude mental que nos leva a querer crescer cada vez mais, ter cada vez mais conhecimento, força e poder, indo o mais longe que possamos conseguir, buscando sempre proteção e segurança individual em detrimento de outrem.

Já o coletivismo é algo raro. É o que chamo de terceira vertente. Terceira porque não é nem uma atitude individual, nem o coletivismo que estamos acostumados, e sim um coletivismo ‘verdadeiro’, muitas vezes associado a grandes homens, mas que é perfeitamente adaptável a qualquer ser humano comum.

Este conceito é basicamente a negação da individualidade. A doação do seu eu para a coletividade. Abrir mão de si e de seus desejos em prol da coletividade.

O que vejo, é que, quando alguém, remando contra a maré ou por puro acidente, segue por este caminho, acaba gerando SEMPRE algo muito muito positivo, e muitas vezes imbatível.

Gandhi e seus seguidores são um bom exemplo. Sua atitude, não se importando consigo mesmo, chegando a se deixar prender pelo governo Inglês pacificamente e em seguida simplesmente não fazer nada. Ficar na cadeia e esperar. Os ingleses prendendo mais e mais até simplesmente não haver mais espaço nas prisões. Esta atitude pacífica, sem ataques violentos, levou à independência da Índia.

Nos início dos anos 60 a cidade de Nashville nos EUA, era dividida entre serviços para brancos e para negros. Havia bares, escolas, locais públicos que não admitiam negros. Nos ônibus os negros eram obrigados a se sentarem atrás. Aí 2 pastores negros (Kelly Miller Smith e James Lawson) começaram a dar palestras para seus fiéis, preparando-os para pacificamente entrar nos lugares dos brancos e simplesmente ficar lá.

Depois de meses de discussões e preparação para isto, um grupo entrou em um bar branco e ficou lá simplesmente. Foram expulsos á força. Nesse momento, outro grupo entrou, e lá ficou. Isso se repetindo vários dias, a polícia prendeu um grupo, e no mesmo instante entrou outro no lugar desse.

Os negros passaram a boicotar os produtos de brancos, e estes começaram a ter prejuízo.

Isso conquistou o direito dos negros de terem acesso a todos os lugares, e acabou com a segregação racial.

Exemplos como esses mostram o que quero dizer: Negação da individualidade e do medo individual, para a doação para uma coletividade maior.

Alguém podia argumentar que isso foi apenas uma mera associação contra outra parte, e que se encaixa no conceito normal de coletivismo.

Entretanto a diferença está na forma com que foi feita a ação. Nem Gandhi, nem os pastor es atacaram de qualquer forma seus opositores. Eles simplesmente usaram sua liberdade e estiveram dispostos a apanhar e sofrer humilhações, sem reagir.

Isso gera uma força inimaginável, e impossível de ser combatida na minha opinião.

Não estou dizendo que precisamos ser santos. Estou dizendo que precisamos de mudar a atitude mental. De uma atitude centrada no indivíduo, para uma atitude social e centrada na sociedade.

Estou dizendo que ao tomarmos uma decisão ainda que pequena, como comprar um produto ou serviço, deveríamos pensar muito mais o que aquela decisão implica socialmente.

Ao adquirirmos produtos a um preço exageradamente baixo, alimentamos a miséria em outra parte do mundo. Ao ouvirmos música de péssima qualidade impedimos grandes artistas de ter sucesso. Isso são exemplos pequenos. Talvez você pense que isso não afeta em nada a sociedade. Acho porém que a falta de consciência para esses detalhes é que nos leva a tomar atitudes muito mais sérias e conseqüentemente muito mais erradas como alimentar a corrupção ou votar em políticos que irão nos dar vantagens.

No meio empresarial temos também bons exemplos do ganho com esta atitude: Quando a IBM lançou o PC haviam 3 grandes linhas de computadores 16 bits no mercado mundial cada uma com sua fatia de mercado: Apple Macintosh, Atari ST e Commodore Amiga. Quando o PC foi lançado era sem nenhuma sombra de dúvida o pior das 4 linhas. De longe. Entretanto, como não era interessante para a IBM continuar com isso, ela abriu a patente do hardware.

Isso ao invés de dar prejuízo à IBM, fez com que começassem a pipocar fabricantes de hardware para PC no mundo todo, abaixando assustadoramente o preço e transformou o PC no que ele é hoje. O Amiga acabou, assim como o Atari, sobrando apenas o Macintosh com sua limitadíssima parcela de mercado que vemos hoje. E a IBM acabou lucrando e muito com o novo mercado que surgiu.

O Linux é outro exemplo, que vem desbancando servidores e mais servidores da Microsoft. Se tornou o melhor sistema operacional do mercado. Tudo porque Linus Torvald abriu mão de sua patente e a comunidade ajudou, aliás o movimento de software livre é um ótimo exemplo desse ideal.

O coletivismo, essa atitude social e não individual, é o que cria realmente um mundo sem conflitos.

É o que precisamos

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